Foto retirada do Flickr da Família Bolsonaro. Link para a foto: https://www.flickr.com/photos/fotosbolsonaro/44358934635/in/photostream
O
candidato do PSL iniciou o segundo turno com boa folga e, apesar de não
confiáveis, as pesquisas de intenção de voto para o segundo turno conferem a
Bolsonaro vantagem confortável para a vitória sobre o petista.
A
autocrítica é sempre válida e deve se fazer presente sempre em nossas vidas.
Reproduzo
abaixo um texto de bastante lucidez do professor Gustavo Bertoche (que é de
esquerda), onde ele aponta onde a esquerda errou para estar, a poucos dias do
pleito, sem rumo. Da mesma forma, a Direita também deve estar atenta para
possíveis ajustes a serem feitos e jamais cair na ilusão de achar que está tudo
bem.
O título desta publicação
foi o mesmo que o Gustavo utilizou para compartilhar seu pensamento no Facebook (Link para a publicação original: goo.gl/TvZ7jj):
Desculpem
os amigos, mas não é de um "machismo", de uma "homofobia"
ou de um "racismo" do brasileiro. A imensa maioria dos eleitores do
candidato do PSL não é machista, racista, homofóbica nem defende a tortura. A
maioria deles nem mesmo é bolsonarista.
O
Bolsonaro surgiu daqui mesmo, do campo das esquerdas. Surgiu da nossa
incapacidade de fazer a necessária autocrítica. Surgiu da recusa em conversar
com o outro lado. Surgiu da insistência na ação estratégica em detrimento da
ação comunicativa, o que nos levou a demonizar, sem tentar compreender, os que
pensam e sentem de modo diferente.
É,
inclusive, o que estamos fazendo agora. O meu Facebook e o meu WhatsApp estão
cheios de ataques aos "fascistas", àqueles que têm "mãos cheias
de sangue", que são "machistas", "homofóbicos",
"racistas". Só que o eleitor médio do Bolsonaro não é nada disso nem
se identifica com essas pechas. As mulheres votaram mais no Bolsonaro do que no
Haddad. Os negros votaram mais no Bolsonaro do que no Haddad. Uma quantidade
enorme de gays votou no Bolsonaro.
O
eleitor não votou no Bolsonaro PORQUE ele disse coisas detestáveis. Ele votou
no Bolsonaro APESAR disso.
O
voto no Bolsonaro, não nos iludamos, não foi o voto na direita: foi o voto
anti-esquerda, foi o voto anti-sistema, foi o voto anti-corrupção. Na cabeça de
muita gente (aqui e nos EUA, nas últimas eleições), o sistema, a corrupção e a
esquerda estão ligados. O voto deles aqui foi o mesmo voto que elegeu o Trump
lá. E os pecados da esquerda de lá são os pecados da esquerda daqui.
O
Bolsonaro teve os votos que teve porque nós evitamos, a todo custo, olhar para
os nossos erros e mudar a forma de fazer política. Ficamos presos a nomes
intocáveis, mesmo quando demonstraram sua falibilidade. Adotamos o método mais
podre de conquistar maioria no congresso e nas assembleias legislativas, por
termos preferido o poder à virtude. Corrompemos os veículos de mídia com
anúncios de empresas estatais até o ponto em que eles passaram a depender do
Estado. E expulsamos, ou levamos ao ostracismo, todas as vozes críticas dentro
da esquerda.
O
que fizemos com o Cristóvão Buarque?
O
que fizemos com o Gabeira?
O
que fizemos com a Marina?
O
que fizemos com o Hélio Bicudo?
O
que fizemos com tantos outros menores do que eles?
Os
que não concordavam com a nossa vaca sagrada, os que criticavam os métodos das
cúpulas partidárias, foram calados ou tiveram que abandonar a esquerda para
continuar tendo voz.
Enquanto
isso, enganávamo-nos com os sucessos eleitorais, e nos tornamos um movimento da
elite política. Perdemos a capacidade de nos comunicar com o povo, com as
classes médias, com o cidadão que trabalha 10h por dia, e passamos a nos iludir
com a crença na ideia de que toda mobilização popular deve ser estruturada de cima
para baixo.
A
própria decisão de lançar o Lula e o Haddad como candidatos mostra que não
aprendemos nada com nossos erros - ou, o que é pior, que nem percebemos que
estamos errando, e colocamos a culpa nos outros. Onde estão as convenções
partidárias lindas dos anos 80? Onde estão as correntes e tendências lançando
contra-pré-candidatos? Onde estão os debates internos? Quando foi que o partido
passou a ter um dono?
Em
suma: as esquerdas envelheceram, enriqueceram e se esqueceram de suas origens.
O que
nos restou foi a criação de slogans que repetimos e repetimos até que passamos
a acreditar neles. Só que esses slogans não pegam no povo, porque não
correspondem ao que o povo vivencia. Não adianta chamar o eleitor do Bolsonaro
de racista, quando esse eleitor é negro e decidiu que não vota nunca mais no
PT. Não adianta falar que mulher não vota no Bolsonaro para a mulher que
decidiu não votar no PT de jeito nenhum.
Não,
amigos, o Brasil não tem 47% de machistas, homofóbicos e racistas. Nós
chamarmos os eleitores do Bolsonaro disso tudo não vai resolver nada, porque o
xingamento não vai pegar. O eleitor médio do cara não é nada disso. Ele só não
quer mais que o país seja governado por um partido que tem um dono.
E não, não está
havendo uma disputa entre barbárie e civilização. O bárbaro não disputa
eleições. (Ah, o Hitler disputou etc. Você já leu o Mein Kampf? Eu já. Está
tudo lá, já em 1925. Desculpe, amigo, mas piadas e frases imbecis NÃO SÃO o
Mein Kampf. Onde está a sua capacidade hermenêutica?).
Está
havendo uma onda Bolsonaro, mas poderia ser uma onda de qualquer outro
candidato anti-PT. Eu suspeito que o Bolsonaro só surfa nessa onda sozinho
porque é o mais antipetista de todos.
E a
culpa dessa onda ter surgido é nossa, exclusivamente nossa. Não somente é
nossa, como continuará sendo até que consigamos fazer uma verdadeira
autocrítica e trazer de volta para nosso campo (e para os nossos partidos) uma
prática verdadeiramente democrática, que é algo que perdemos há mais de vinte
anos. Falamos tanto na defesa da democracia, mas não praticamos a democracia em
nossa própria casa. Será que nós esquecemos o seu significado e transformamos
também a democracia em um mero slogan político, em que o que é nosso é automaticamente
democrático e o que é do outro é automaticamente fascista?
É hora de utilizar
menos as vísceras e mais o cérebro, amigos. E slogans falam à bile, não à
razão.
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